Como
Eu Gostaria
Como
eu gostaria de ver um rosto
na multidão, entre
centenas, e desenhá-lo.
A sua expressão daquele
momento. Sentir seu projeto
de vida, vago e indistinto,
que se perdeu, e nem é
mais um sonho. E eu gostaria
de captar o amor, senti-lo,
com suas nuances, e tentar
entendê-lo naquela etapa
fugaz. Mas, quanto dele é
inconsciente, e se espalha
no espaço, mas intangível.
E alguns o captam e tocados
pelo seu ardor, observam com
volúpia as formas encobertas
daquela moça. E se
apaixonam. E às vezes
se lembram dela, e depois
a esquecem. E ela se sente
tocada em seu íntimo,
sorri intimamente, e se vai.
Para sempre.
Como eu gostaria de salvar
a criança, que passa,
levada pela mão do
homem alto, de terno escuro,
pasta na outra mão,
que a leva com passos largos,
que ela mal consegue acompanhar,
a atravessar a avenida, entre
centenas de carros e de pedestres,
que não a vêem,
que nada percebem, correndo
para seus lares, pretensamente
seguros, ou para outro trabalho,
ou para a escola. E lá
vai ela, para onde?
Como eu gostaria de dizer
algo para a colegial, sentada
na esquina, com o olhar vago,
a expressão perdida,
à espera de nada. O
pior talvez esteja na sua
própria casa. A dor
a consome, mas ela não
a sente. Está muito
aturdida para sentir. A dor
só explodirá
anos mais tarde, se ela chegar
até lá. Na forma
de um vício, de uma
agressão ao próprio
filho, de um desespero sem
trégua ou de uma insensibilidade
opaca.
Como eu gostaria de salvar
de uma morte estúpida
o pequeno cão aterrorizado,
em busca de um abrigo seguro,
fugindo dos moleques, veloz
por entre as rodas dos carros
e os pés dos transeuntes,
que, ou será trucidado
por um carro veloz, se transformando
em uma pasta de carne no asfalto,
ou será cercado, laçado
e levado pela carrocinha,
para morrer de uma forma atroz,
nas mãos de homens
insensíveis.
Como é duro ver um
ser humano na sua mais indigna
condição, mendigando
uma esmola, um prato de comida,
com uma roupa sem forma e
sem cor, imunda, a exalar
um mau cheiro que se sente
à distância e
provoca nojo nas pessoas que
por ele passam.
Que calafrio provoca a visão
de um operário, pendurado
em um assento, sustentado
por duas cordas, a balançar
ao lado da parede imensa de
um prédio, a pintá-la,
sem qualquer proteção,
prestes a dar a sua vida em
troca de nada, e a deixar
a sua esposa e os seus filhos
inteiramente ao desamparo,
prováveis futuros delinqüentes.
Estas cenas, comuns em todas
as nossas grandes cidades,
já se tornaram 'invisíveis'
à maioria, e mesmo
quando alcançam o seu
terrível ápice,
lidas, então, com formalidade
pelos profissionais dos canais
de TV ou das emissoras de
rádio, redigidas nesse
mesmo padrão pelos
redatores dos jornais, raramente
provocam sequer um comentário
aos desatentos telespectadores,
tensos em retornar ao trabalho,
pagar suas contas, encarar
o trânsito pesado.
Abilio Terra Junior
26/10/2008
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