Dormíamos.
Eu, acordado, dormia. E elas
dormiam de fato. E a lógica
escorria pelo ralo. E monstros
brincavam de nonsense. E a
madrugada se despregava do
dia. E pequenos bichos se
escondiam da lua. E havia
um mundo mais objetivo e com
sentido, mais rude, e outro,
mais leve, penetrante e arguto.
E os seres pensavam que se
entendiam e se enganavam com
suas emoções,
envolvidos pelos seus corpos.
E o tempo esperava que tropeçassem.
E o espaço sinuoso
perseguia a amplidão.
Novas flores brotavam e sorriam
solitárias. As sementes
trabalhavam, junto com as
formigas, silenciosas, exemplares.
Os cães entendiam e
sorriam entre si. A grande
aurora boreal se cansava e
chorava, descrente. A serpente,
serena, confraternizava com
a coruja. A noite, a grande
companheira, tentava esconder
os loucos. O dia crescia,
levando a todos
de roldão,
e depois se mudava.
A grande face, impenetrável
e conspícua, permanecia
desconhecida, menos dos lobos,
que a saudavam, reverentes.
As estrelas também
eram solitárias, com
a diferença de que
sabiam que o eram. Os sonhos
se encontravam, sorrateiros.
Os mais experientes ensinavam
aos mais novos como caminhar
na imensa gruta escura sem
cair nos abismos, gerando
luz própria. A vida,
imensa, aninhava a pequena
morte no seu regaço,
dando-lhe de mamar. A morte
sugava o opulento seio, sôfrega,
com seus penetrantes olhos
escuros destilando amor à
vida.
Abilio
Terra Junior
02/08/2008