A
TEIA DE ARANHA
Spider tenta montar o seu
quebra-cabeças.
Ele admirava e amava a sua
mãe e acreditava que
o seu pai a havia matado e
a substituído por uma
prostituta.
Ele acaba de sair de um manicômio
e se instalou em um quarto
humilde de uma pensão
para loucos em fase de recuperação.
Ele tenta se lembrar de cada
cena, de cada detalhe da sua
infância e anota tudo
em uma caderneta, com traços
desconexos que talvez só
ele mesmo entenda.
Ele balbucia todo o tempo
e usa quatro camisas de uma
só vez. À dona
da pensão, surpresa
com aquilo, um velho que ali
também reside explica
que "a roupa faz o homem
e quando falta o homem, aumenta
a roupa."
Spider lembra-se da prostituta
loura que mostra um dos seios
para ele, dando uma gargalhada,
quando ele foi chamar o seu
pai no bar, para jantar. E
de como o seu pai e a sua
mãe se agarraram despudoradamente
, quando saíram para
irem ao bar, e de como ele
odiou aquela cena.
Ele relembra a cena da sua
mãe saindo para ir
buscar o seu pai, e então
ela o encontra no barraco
transando com a prostituta
loura em uma poltrona velha,
e de como o seu pai empurrou
a prostituta contra a parede
de lata, e bateu violentamente
com uma pá na cabeça
da sua mãe, que trocou
alguns passos indecisos antes
de cair sobre o pequeno canteiro
de hortaliças. E de
como o seu pai cavou um túmulo
ali mesmo, sob o olhar indiferente
da prostituta, e de como ambos
jogaram com desprezo o corpo
da sua mãe no túmulo,
enrolado em um velho tapete.
E de como o seu pai levou
a prostituta para a sua casa,
e dormia com ela na mesma
cama onde, antes, dormia com
sua mãe. E de como
ele, Spider, os acusou de
assassinos e de como o seu
pai o perseguiu, com o cinto
na mão. E, no barraco
onde tudo aconteceu, seu pai
o descobre, escondido, e conversa
com ele e pergunta se ele,
Spider, acreditava mesmo que
ele havia matado a sua mãe.
E de como ele respondeu que
não, mas ao passar
pelo local onde o corpo da
sua mãe estava enterrado,
disse, baixinho: - Desculpe-me.
E de como ele arquitetou um
plano genial para matar o
seu pai e a agora sua mãe,
a prostituta loura. E, de
como, assim como uma aranha
("spider" em inglês),
ele faz, com barbantes, uma
teia de aranha no seu quarto.
E, dali, ele leva um fio de
barbante até o botão
do fogão que liga o
gás, no andar inferior.
E puxa o fio, do seu quarto,
e sente que a sua vingança
está se consumando.
E, de como o seu pai entra,
tonto pela inalação
do gás, em seu quarto,
e o retira de lá, e,
em seguida, arrasta o corpo
da sua mulher até a
rua. E diz para Spider: -
Você a matou! Você
matou a sua mãe! E,
de como o corpo que jaz sem
vida no chão é
mesmo o da sua mãe!
Filme "Spider",
Canadá, 2002, direção
de David Cronemberg, com Ralph
Fiennes, Miranda Richardson,
Gabriel Byrne e Lynn Redgrave.
No livro "Wim Wenders.
Psicanálise e Cinema",
o psicanalista e cinéfilo
Geraldino Alves Ferreira Netto
tece comentários que,
a meu ver, embora não
se refiram ao filme em questão,
ajudam-nos a entender a complexa
e intrincada "teia de
aranha" que simboliza
a vida de Spider.
Na Terceira parte – Uma leitura
psicanalítica – 1.
A questão do Pai",
o autor explica com clareza
e objetividade as fases do
complexo de Édipo,
em uma leitura freudiana.
Na primeira fase, a criança
se espelha na mãe e
"nessa interação,
estabelece-se uma relação
narcísica entre ambas,
uma ilusão de completude
e de totalidade"... E,
mais à frente: "Com
esse ato, a função
paterna se interpõe
entre mãe e filho,
interditando a fusão
do desejo da mãe com
o desejo do filho, intervenção
essa que se chama de proibição
do incesto, ao mesmo tempo
que é uma autorização
explícita para que
a criança venha a desejar
e escolher futuramente qualquer
parceiro que lhe convier."
(pg. 126)
Parece-me que o nosso personagem
Spider não conseguiu
ultrapassar essas fases, o
que é bem visível
na cena em que ele retorna,
de carro, para o manicômio,
na figura de criança,
que ele nunca deixou de ser.
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