Jogando
Conversa Fora
Descia a avenida a pé,
fazia frio, ainda bem que
estava agasalhado. O frio
chegara cedo, imagine quando
o inverno chegar mesmo...
Algumas estudantes passavam
por ele, apressadas. Com o
sinal fechado, esperou os
carros passarem. Outros sinais,
outras ruas, outra avenida.
Os indianos nus, os homens
santos, andando calmamente
entre as pessoas (na Índia,
naturalmente). Outro povo,
outra cultura. Os dois maiores
países tropicais do
mundo, Brasil e Índia.
Países de contrastes,
pontos comuns e pontos divergentes.
Lá, uma cultura milenar;
aqui, uma cultura secular.
Com a sua grande experiência,
encontraram diversas soluções
ecológicas, que poderíamos
aproveitar. Lá, há
muito maior concentração
populacional do que aqui.
E quanto às religiões,
nem se fala! Muita complexidade,
mas como penetrar nessa complexidade?
Uma coisa é se ler
a respeito, outra coisa é
praticar. Mas, de um modo
geral, o que as tradições
religiosas indianas (e como
outras tradições
orientais ensinam também,
como o Budismo) é que
se cada um não se esforçar
e não assimilar e praticar
o conteúdo real dos
ensinamentos, ficará
para sempre preso ao ciclo
interminável do "samsara",
das reencarnações,
"traduzindo" para
o nosso entendimento.
Lembrava-se de uma tarde,
em Brasília, sentara-se
à uma mesa de um restaurante,
perto da Igrejinha, e ficara
conversando com um outro cliente,
sentado à outra mesa,
sobre os mais diversos assuntos,
ambos bebendo cerveja. Às
vezes, tomava cerveja em pé,
em um bar, ali na quadra do
Beirute, mas na outra extremidade,
e começava a conversar
também com outro cliente,
jogando conversa fora, apenas
para passar o tempo. Tempos
de Brasília, tudo tão
diferente. Aqueles espaços
amplos davam-lhe uma sensação
de liberdade e de angústia,
pois era apenas uma sensação,
não a liberdade de
fato.
Em Belo Horizonte, as pessoas
tomavam as ruas, do centro,
principalmente. Os carros
se amontoavam nas avenidas
e ruas. Os quarteirões
eram menores, havia trechos
do centro que lembravam um
mercado persa; não
que ele achasse ruim, pelo
contrário, gostava
de andar no meio daquela multidão,
muitos quase correndo, outros,
devagar, quase parando, gente
de todo tipo. Bares espalhados
nas calçadas, onde
à tardinha, casais,
grupos de colegas ou amigos,
alguns poucos solitários,
se sentavam, tomavam as suas
cervejas, conversavam animadamente,
comiam os seus petiscos. Havia
os sebos, num dos quais ele
encontrara alguns livros raros,
solicitados pelo professor.
Demorara algum tempo, mas
encontrara. Estava agora,
lendo-os, um a um. Manifesto
Decadente, Manifesto Simbolista,
o Futurismo, o Expressionismo,
o Cubismo, o Cubofuturismo,
o Dadaísmo, o Espiritonovismo,
o Surrealismo... os manifestos
vanguardistas, tudo em um
livro. Havia vários
outros para ler. Bom, não
podia se queixar de material
para leitura... e de boa qualidade.
O convívio era mais
ameno também, as pessoas
sorriam e se comunicavam facilmente,
sem maiores preocupações.
E havia vida cultural também,
como, só para citar
um exemplo, um conjunto musical
que resgatara lindas músicas
do passado, formado por quatro
cantoras, que reviviam sucessos
da MPB há muito esquecidos,
com muita graça e talento,
chamado Carona Brasil, mostrando
o quanto é rica a nossa
música, quando se expressa
em suas fontes originais.
E havia a famosa reserva mineira,
tão difícil
de se explicar para os próprios
mineiros, imagine-se então,
para outros "povos".
Sempre havia um "ponto
vago", difícil
de definir, e que não
poderia e não deveria
ser transposto. E isso parecia
levar o relacionamento para
um campo abstrato,que não
era tão abstrato assim,
pois estava ligado à
normas de conduta social bem
concretas. Tudo muito vago,
impreciso, mas que se traduzia
em preceitos, talvez seculares,
trazidos possivelmente de
um duro e seco viver rural
e interiorano, formação
básica da população
mineira e belorizontina. Lembrava-se
dos livros do autor mineiro
Autran Dourado, que transmitiam
muito desse modo de viver
mineiro, "Ópera
dos Mortos", "Uma
Vida em Segredo", "Um
Artista Aprendiz", verdadeiras
obras-primas, que tocavam
a alma mineira profundamente
e nos transmitiam muitos desses
"segredos" inominados,
subliminares.
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