MENTIRA
Asdrúbal era um funcionário
público que vivia no
Rio de Janeiro do início
do século passado.
Trabalhava no centro da cidade
e ia e voltava em um bonde
sacolejante que provocava
sono. A sua vida era bem rotineira.
No fim de semana, dava umas
voltas com a esposa, Carmem
e os três filhos no
Jardim Botânico, respirava
aquele ar puro e depois, voltava
para sua casa no subúrbio.
Às vezes, assistia
a uma peça de teatro,
quando o dinheiro sobrava,
com a Carmem. Davam também
passeios próximos à
praia, mas sem entrar na água,
ele não gostava que
ficassem de olho nas formas
da mulher, achava o mar perigoso
para os filhos, e, nem apreciava
exibir o seu físico,
que não era dos mais
privilegiados...
E a vida continuava, naquela
modorra de sempre. Até
que um dia...
Voltava Asdrúbal do
trabalho, cansado, esgotado
de agüentar o seu chefe,
que não "largava
do seu pé", em
um dia ensolarado, suado,
doido para chegar em casa
e tomar um banho de água
quente na sua banheira tão
estimada. Carmem já
sabia o seu horário
de chegada e esquentava a
água em um caldeirão,
no fogão a lenha, de
modo que Asdrúbal não
perdesse um minuto sequer,
para tomar o seu banho sagrado.
Estava naquele bonde que parecia
não chegar nunca ao
seu destino, quando uma morena
sestrosa pediu licença
e se sentou ao seu lado. O
bonde estava muito cheio,
assim, ficaram bem juntos,
colados um ao outro. Asdrúbal
começou a sentir a
temperatura subir mais ainda.
Cada sacolejada do bonde os
aproximava, ele e a morena,
pernas, coxas, braços...
sentia aquele seio macio e
firme roçar em seu
braço... Deu uma olhada
para a morena e ela retribuiu
seu olhar com um sorriso maroto.
Ele sorriu também,
meio sem jeito, e disse: -
Mas que calor, hein? E ela:
- Valha-me Deus! Acho que
o Rio nunca esteve tão
quente! – abanando as mãos.
Ele reparou melhor nas suas
formas, tudo nos seus devidos
lugares e na proporção
certa! Que obra da natureza!
Ele perguntou: - Você
é daqui mesmo? E ela:
Sim, sou daqui e você
? – Eu também. E ele:
- Mora em Santa Tereza? E
ela: - Um pouco antes.
Asdrúbal se animou:
- Quer tomar alguma coisa,
na próxima parada?
E ela:- É, pensando
bem, até que não
é uma má idéia,
com esse calor! – com um sorriso
cativante.
E assim fizeram, desceram
do bonde, entraram em um restaurante
próximo, escolheram
uma mesa, se sentaram e começaram
a conversar bem à vontade,
como se fossem velhos amigos.
Combinaram se encontrar no
dia seguinte, no mesmo horário.
Ao chegar em casa, Carmem
estranhou, isso nunca acontecia,
Asdrúbal se atrasar.
Ele lhe explicou que na última
hora, o chato do chefe lhe
mandara fazer um levantamento
urgentíssimo, mas que
cara cansativo aquele! Carmem
aceitou a explicação,
preparou o banho e Asdrúbal
tomou um banho delicioso,
se lembrando da morena, que,
por sinal, se chamava Isabel.
Asdrúbal se encontrou
com Isabel no dia seguinte,
e, não só no
dia seguinte, mas nos dias
que se seguiram e nos meses
que se seguiram, pois o namoro
engatilhou mesmo, e com o
passar do tempo, Isabel se
tornou sua amante.
Na cama, nem é bom
falar! Isabel era perfeita!
Não apenas o corpo,
com suas formas feitas "na
medida" pelo Criador,
mas no carinho, no sorriso
deslumbrante, e no jeitinho
todo especial que tinha nas
"artes do amor",
como se costumava dizer naquele
tempo.
E Asdrúbal, entusiasmado!
Carmem é que não
estava apreciando muito aqueles
atrasos constantes, aquelas
saídas para trabalhar
a mais, a mando do chato do
chefe, aquele papo que nunca
terminava com os amigos. Às
vezes, ficava meio desconfiada,
matutando, mas olhava bem
para o Asdrúbal e pensava
"não é
possível que o Asdrúbal...
com essa cara, com esse físico,
não... não acredito!"
Naquele tempo ainda não
existiam as atuais "camisinhas",
e assim, Asdrúbal e
Isabel se ajeitavam como podiam,
usando mil e um "métodos
anticoncepcionais", se
é que se podiam chamar
assim, para que não
surgisse "uma surpresa"...
Mas, apesar de todos os seus
esforços, mais dia,
menos dia, houve uma "escorregadela",
e... Isabel engravidou. E
agora?
Asdrúbal e Isabel pensavam,
pensavam, se afligiam, se
olhavam... e a barriguinha
de Isabel começou a
se transformar numa barrigona!
Os nove meses passaram e nasceu
o rebento! Um garotinho com
olhos vivos, brincalhão,
risonho, uma graça
o neném! Não
é preciso dizer que
tanto Asdrúbal quanto
Isabel se derretiam com o
menino. A essa altura, Asdrúbal
precisou alugar uma casa modesta,
para onde Isabel e o pequeno
Felipe (era esse o nome do
bebê) se mudaram.
Não é preciso
explicar que Asdrúbal
se afastou ainda mais de Carmem
e dos filhos primeiros, e
que o dinheiro começou
a faltar para a família,
pois o salário de Asdrúbal
aumentara pouco, nesse meio
tempo, e as despesas haviam
aumentado... substancialmente!
As suspeitas de Carmem aumentaram
e ela começou a duvidar
das suas primeiras conclusões
quanto ao Asdrúbal...
Ainda por cima, algumas das
suas amigas viviam insinuando
que seu dileto marido tinha...
uma amante!
Carmem coçou a cabeça
e um dia se decidiu: ia passar
tudo a limpo!
Quando Asdrúbal saiu,
ela o seguiu, sorrateiramente,
tomou o bonde alguns bancos
mais atrás e quando
ele desceu do bonde, ela desceu
também.
E o foi seguindo, a uma distância
considerável, mas que
o mantinha sob sua vista.
Andaram alguns quarteirões
e, de repente, Asdrúbal
parou frente à uma
porta, tirou do bolso uma
chave, a abriu e sumiu, fechando
a porta. Carmem apressou o
passo, ansiosa, respirando
fundo. Parou frente à
casa. Tomou coragem, é
agora ou nunca, e bateu na
porta. Demorou algum tempo
e ninguém atendeu.
Bateu de novo, agora, com
mais força, estava
muito nervosa. Ouviu o barulho
da chave se movendo na fechadura
e... a porta se abriu lentamente...
Era Asdrúbal, que,
ao ver Carmem, mudou de cor,
ficou pálido como um
fantasma. Tentou dizer alguma
coisa, mas as palavras não
saiam e mil e uma idéias
se atropelavam dentro da sua
cabeça. Carmem também
ficou muda. Os dois ficaram
se olhando.
Até que, como se uma
idéia luminosa surgisse,
de repente, na sua mente,
Asdrúbal recobrou o
ânimo e a cor, e abrindo
um largo sorriso, abriu também
os braços e disse:
- Carmem, querida! Mas que
surpresa! Venha, entre! Quero
que você conheça
a minha prima, lá do
interior de Minas! Vim visitá-la,
coitada! Ela acaba de ter
um bebê, mas foi abandonada
pelo safado do seu marido!
Venha! Venha!
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